Terça-feira, 27 de Abril de 2004
Agonizo lentamente no beijo que não me deste
estremeço no desejo de o ter tido eterno
apenas sinto dor na carícia que me retiras
quando penso que não há Verão em qualquer Inverno.
Agonizo lentamente no abraço que me faz falta
estremeço no profundo anseio de o ter sentido forte
apenas diviso lágrimas na imensa loucura
quando caminho em direcção à tua morte.
Agonizo serenamente na dor que me cobre
estremeço de frio no túmulo da tua jazida
apenas limpando a dor da profunda desventura
da desdita corrida que fizeste contra a vida.
Segunda-feira, 26 de Abril de 2004
A tremenda parecença do céu nublado com um pulmão humano, é notável.
Domingo, 18 de Abril de 2004
"...é no vento que se ama; talvez ser o próprio vento e não a folha..."
(para mim a melhor definição sobre o que é amar; in www.lobices.blogs.sapo.pt)
Sábado, 17 de Abril de 2004
Há dias em que me calo
digo eu para não errar
mas não é por isso
não é o erro que me amedronta
mas o que fazer dele depois
do nascer quando se avoluma
e me pesa e me pisa
e me enterra
é o medo de mim nos dias em que não me sei defender
nesses dias prefiro boiar à superfície
à espera
de ser tromba de água
e pegar os erros no ar transportando-me com eles
mas não é só por isso que me calo
é também pelas histórias de batalhas em que fui guerreira
deixando noutros as marcas da minha sanguinolência
e em mim outras
que quero atenuar
calo-me ainda e sobretudo porque não me sinto em casa
enganei-me e entrei na porta ao lado
e quando me dei conta já me tinha dado e recebido
e tive vergonha de sair antes do tempo considerado educado
para fechar o ciclo
para abrir a porta
receando não encontrar depois uma porta certa onde estivesse ainda alguém acordado
que me reconhecesse e deixasse entrar
agora ando de novo à procura
de me sentir em casa
(from:
Ana Viana, em "Passagens Sublinhadas", Novembro de 2000)
Sexta-feira, 16 de Abril de 2004
Bastava-nos amar. E não bastava
o mar. E o corpo? O corpo que se enleia?
O vento como um barco: a navegar.
Pelo mar. Por um rio ou uma veia.
Bastava-nos ficar. E não bastava
o mar a querer doer em cada ideia.
Já não bastava olhar. Urgente: amar.
E ficar. E fazermos uma teia.
Respirar. Respirar. Até que o mar
pudesse ser amor em maré cheia.
E bastava. Bastava respirar
a tua pele molhada de sereia.
Bastava, sim, encher o peito de ar.
Fazer amor contigo sobre a areia.
from:
(Joaquim Pessoa)
Quarta-feira, 14 de Abril de 2004
Onde te deixei ficar um dia
numa tarde de Outono
onde a brisa fresca te envolvia
e teu olhar pedia
não sei porque te deixei
ali ficar um dia
numa tarde de Outono
onde o frio que trazia
me cortava o coração de dor
não sei onde ficou a dor de te deixar
nessa tarde de Outono
onde o vento se revolvia
nessa tarde
nesse dia...
Terça-feira, 6 de Abril de 2004
Estou cansado de ser quem sou. Preciso mudar. Deixar de ser um e passar a ser outro. Mas quem? E, porquê este desejo? Não sei. Não me reconheço. Estou cansado de mim. Quero renascer em ti. Mas tu, quem és? Que fazes aí? Porque olhas assim para mim? Achas que devo mudar, é? Mas, diz-me ao menos para quê? De que me serve mudar? Se mudando não mudo a minha alma? De que serve mudar se voltar a ficar cansado da mudança? Porque entendes que deve existir mudança? Não posso ficar aqui? Onde sou? Como estou? Para que vim? Para onde queres que eu vá? Diz-me. Faz-se tarde e a viagem tem de ser iniciada de novo. Já nada do ontem levarei comigo. Fica tudo ali onde fui eu, onde estive e me despi da pele que me cobre a alma agora desnuda. Levarei tão somente o que me vieres a dar. De mãos vazias te seguirei. Sim, irei. Estou cansado de mim. Preciso adormecer o meu ser. Não quero mais acordar aqui. Quero ir. Leva-me.
Domingo, 4 de Abril de 2004
"É. O impossível é possível. Buscando o amor e a humildade. Somos deuses pequenos , pequeníssimos , dum deus maior , que nos deu a grandeza de nessa pequenez termos tudo dele. O corpo - é lugar síntese do desejo , da partilha , do prazer , do repouso - do AMOR. Dois corpos - dois templos de vidas, de milhares de vidas distintas e unas que se sobrepõem e revelam uma catedral infinita ."
(from: E. Cruz)
(parte final de um texto de reflexões publicado no fórum Bibliotec@ do Sapo)
Sexta-feira, 2 de Abril de 2004
(Comentário postado em www.lobices.blogs.sapo.pt gentilmente cedido por quim)
Cada ser tem dois lados um feminino e um masculino. Quando a natureza nos determina à nascença o lado visível é para que cresçamos e em liberdade essa natureza evolua até o identificarmos. Essa identificação faz-se olhando nosso lado visível e invisível, assim como o dos outros. Se não nos interiorizarem imagens estereotipadas, preconceituadas, infernizadas por noções de culpa e não nos violentarem ou manipularem dalgum modo nosso ser íntimo, a natureza evoluirá em permanente construção e essa identificação será espontânea, livre e criativa, para partir sem medos em busca do outro e dos outros. Cedo ou tarde encontrará o outro que não quer como seu espelho, mas o lado visível do seu invisível. Se manipulações, cobranças, vaidade (seja ela qual for), forem as faces visíveis e pouco se perceba os invisíveis dos progenitores, cruzam-se as teias, atam-se nós dolorosos, confundem-se nossos dois lados e seguimos a vida à procura de desatar os nós em que nos enlearam, e em tamanhos emaranhados outros se vão enleando. Lobices - gostei deste nome , dos uivos . Também eu já me senti loba. Aqui vai uma reflexão minha que fiz a partir dum texto lindíssimo de José Eduardo Agualusa: . Dentro de mim pensei - uma gansa é um misto de cisne com loba e ela não triunfa sobre Deus , destrói-lhe a imagem , que o homem criou à sua imagem. Depois já vinha no carro de regresso repensei não no cisne estão todos os animais. No cisne estão dois gatos selvagens, macho e fêmea, gémeos irmãos, que se perderam sós afastados um do outro na floresta, dela saíram e sem rumo ficaram até descerem sozinhos um rio e a ela regressam para se aninharem novamente. Estão todas as aves migratórias, e todas as migrações para chegar ao local do fim que foi a origem. No cisne está a cadela que em si viu a loba partes da gata selvagem e o cão que foi lobo partes do gato selvagem. Está a serpente da terra assim como a do mar e todos os animais por elas mordidos ou sufocados. Está o cão que mordeu a gaivota e a gata que comeu a rola, porque todos anseiam voar, e porque em todas as feridas por todos infligidas e sofridas misturaram seus sangues. A gaivota não mais era só gaivota pois também era cão, rola, gata, e a rola não mais era só rola pois também era gata, cão e gaivota, e a gaivota... e a gata... todos partes duma gansa e dum ganso, com todos os vegetais que ingeriram, o ar e a água que beberam, o fogo em que arderam. Gansa e ganso (mãe é mãe, e é filha e avó e todas são mães, e a filha é filha, e é mãe e avó e todas são filhas, e avó é avó, e é mãe e filha, e todas são avós, pai é pai, e é filho e avô, e todos são pais, filho é filho, e é pai e avô e todos são filhos, e avô é avô, e é pai e filho e todos são avôs) que misturando-se ambos no interior um do outro , darão vida ao cisne voador , que nele tem todos os seres e todos os seres o têm. E então mulher é mulher e também é homem e homem é homem e também é mulher. E todos em cada um serão mães, de todas as filhas e filhos e filhas e filhos de todas as mães, e filhas e filhos de todas as mães e de todos os pais,...., e avós de todos os netos e pais, filhos, filhas, avós e avôs..........ih...incalculável... que fervilhar na minha cabeça...combinações sem fim..... porque como diz Agualusa nada redime a estupidez excepto o amor porque o amor é a sobre quilha da criação....como o sentiu Walt Whitman.
(from: Eureka_cruz@sapo.pt)
Quinta-feira, 1 de Abril de 2004
Hoje tivemos um dia de céu limpo, vento fraco e temperatura de 22 graus.