Sábado, 17 de Abril de 2004
Há dias em que me calo
digo eu para não errar
mas não é por isso
não é o erro que me amedronta
mas o que fazer dele depois
do nascer quando se avoluma
e me pesa e me pisa
e me enterra
é o medo de mim nos dias em que não me sei defender
nesses dias prefiro boiar à superfície
à espera
de ser tromba de água
e pegar os erros no ar transportando-me com eles
mas não é só por isso que me calo
é também pelas histórias de batalhas em que fui guerreira
deixando noutros as marcas da minha sanguinolência
e em mim outras
que quero atenuar
calo-me ainda e sobretudo porque não me sinto em casa
enganei-me e entrei na porta ao lado
e quando me dei conta já me tinha dado e recebido
e tive vergonha de sair antes do tempo considerado educado
para fechar o ciclo
para abrir a porta
receando não encontrar depois uma porta certa onde estivesse ainda alguém acordado
que me reconhecesse e deixasse entrar
agora ando de novo à procura
de me sentir em casa
(from:
Ana Viana, em "Passagens Sublinhadas", Novembro de 2000)